terça-feira, 24 de março de 2015

Para o Utah já!

Que se fodam as pessoas de bem, e os 'senadores', e os sábios, e os homens de letras, e os génios, e os poetas, e os artistas, e os meninos, e os senhores doutores, engenheiros e arquitetos, e os líderes, e os gestores, e os especialistas, e os tecnocratas, e os dirigentes de topo, e as elites, e os oráculos, e os prestigiadores, e os fazedores de opinião, e todos os filhos da puta afins, incluindo eu mesmo, viajando para trás e para a frente em tanto movimento inconsequente, num acumular de conhecimento e conhecimentos e competências e o caralho que os foda a todos. Merda!

Sou pai

Quem diz que ser pai é a melhor coisa do mundo está a exagerar ou a mentir ou então teve uma vida muito triste. Dizer que uma coisa é a melhor do mundo remete ou para um evento limitado no tempo, durante o qual experienciámos uma felicidade quase ininterrupta, ou então para uma análise retrospetiva de uma série de eventos, necessariamente sumária e filtrada pela memória que impõe ao passado o desejo de fazer as coisas parecerem melhores do que foram na verdade. Ora tanto num caso como no outro há coisas que claramente melhor se adequam a esta caracterização. Por exemplo o sexo, enquanto um desses eventos limitados no tempo, ou as várias relações sexuais que temos ao longo da vida, enquanto a tal série de eventos. Ser pai não é isto.

Ser pai é uma série de pequenas ações, esforços, atos de amor, tarefas rotineiras e tentativas de não perder a paciência, frequentemente executados num estado de cansaço que vai para lá do cansaço normal, aquele que sentia antes de ser pai quando tinha dormido pouco, ou feito desporto, ou trabalhado muito (ah!) ou estava de ressaca, mas que pelo contrário é um cansaço miudinho mas persistente, feito pior porque sabemos que não haverá uma pausa, nunca mais. A primeira sensação forte que tive depois de ser pai, após ter garantido que estava tudo bem com a mãe e que a pequena estava saudável, não foi um amor visceral, que me subiu pela espinha e me deixou num estado de êxtase, tal como o descreveram outros pais, mas sim a realização de que a partir deste momento tinha uma responsabilidade em relação à qual não há pausas. Isto é um sentimento único, que não é particularmente bonito ou romântico, mas claramente distintivo, que marcou para mim a transição de pai expetante para pai real: a partir de agora tenho que tomar conta de uma pessoa que depende de mim, que é frágil, que durante muitos anos vai ser demasiado imatura para tomar decisões importantes, e que mesmo depois de ser matura vai continuar a tomar decisões de merda, que vai precisar de mim para comer, para se limpar, para adormecer e em nenhum momento vou poder dizer: pronto, é fim-de-semana, vou descansar disto e volto na segunda. Claro, pode-se sempre deixar a miúda com alguém por umas horas ou mesmo dias, mas nunca mais será o mesmo meus amigos.

Claro que depois vem o tal amor visceral. Calculo que para a mãe seja uma coisa mais imediata e alguns pais acreditam que para eles também. Para mim foi uma coisa gradual. Tão pouco sentia vazio com a minha pequena, mas há uma coisa, um monstro, que foi crescendo dentro de mim, primeiro apenas no cérebro, depois apareceu no estômago, espalhou-se como um tumor e acabou por ocupar tudo cá dentro, que me leva a sentir um amor, um espírito protetor, um desejo de cuidar dela que não se compara a nada mais. Não é a melhor coisa do mundo é outra coisa, mais importante do que isso.

Existem também os momentos especiais, parvos, insignificantes, que para os pais significam muito, como quando ela sorri, ou balbucia qualquer coisa, ou cresce de forma significativa, só que tudo isso é pontuado e disperso. Não é preciso mentir ou exagerar sobre o que é ser pai. Calculo que algumas das coisas que se dizem sobre a paternidade são ditas porque a malta precisa de sentir que há uma razão ulterior para todo o trabalho que têm e então afirmam: é o melhor do mundo, sabendo que não é, mas pensando: se não é o melhor do mundo, para quê tanto trabalho? Tanto trabalho porque os putos nasceram e agora há que cuidar deles, e uma pessoa de jeito tem gosto em fazer bem as merdas que tem de fazer.

domingo, 22 de março de 2015

Longa, má e merdosa

No outro dia vi um indivíduo num consulado português, que renovava o cartão do cidadão. O tipo era tuga mas mal falava português e inglês tão pouco. Teria uns 40 anos, mas tinha um ar tão acabado que tanto poderia ter 25 (e estar muito estragado) ou ter 50 (e estar apenas normalmente estragado). O funcionário que nos atendia, que comigo e com as minhas acompanhantes foi simpático, tratou-o mal. Vestido, metaforicamente, com a minha peruca empoeirada, a minha camisa de lantejoulas e os meus cullots, senti-me culpado. Vi através desta curta interacção social como são as merdas. Só que era tão confortável ser bem tratado, que quando o funcionário voltou para concluir o meu processo sorri-lhe e continuei a nossa dança de gente-de-bem a viver fora do país, que claramente nada tem a ver com estes pobretanas, em vez de lhe dizer que se ele não fosse um beto de merda, que conseguiu emprego no consulado seguramente à custa do caralho de uma cunha, talvez estivesse do outro lado do balcão a necessitar de ajuda para não morrer à fome. Filhos-da-puta, ele e eu.

Que vida terá aquele gajo, o português que mal fala português? Vai na volta é mais feliz do que eu. Não me refiro à ideia da felicidade dos ignorantes, porque isso é um conceito de merda inventado pelos burgueses melancólicos, que gostam de romantizar a pobreza e a barbárie. Ser pobre é fodido, não ter capital social nem capital normal, nem competências que possam ser realçadas num currículo de forma a conseguir aquela primeira entrevista, na qual com uma mistura de charme e uma atitude empreendedora, mas ainda assim humilde, conseguimos convencer o potencial empregador a dar-nos dinheiro em troca de fingirmos todos que aquilo no qual trabalhamos vale um pintelho.  Ao olhar para este tipo imaginei que ele teria uma vida de merda, com um emprego de merda, com um patrão de merda, com uns filhos de merda que andam na rua armados em mitras e uma mulher que o despreza, por lhe dar apenas esta vida de merda. Mas se calhar enganei-me, se calhar o gajo tem dinheiro e na comunidade dele é o rei. Ainda assim apenas o consigo visualizar como o rei da merda, tipo um proprietário de casas para pobres, imigrantes ilegais e carochos, tipo slum landlord, conhecidos nos bairros pobres americanos como mais filhos-da-puta que todos os outros, pois ao menos os restantes ricos vivem isolados da pobreza e podem fingir que não sabem das suas verdadeiras consequências.

Claro que no meio disto tudo o estúpido sou eu. A minha culpa esquerdista impede-me de o ignorar, ou de o desprezar da mesma forma que o interlocutor do consulado, o meu conforto impede-me de o ajudar e os meus preconceitos impedem-me de imaginar uma vida para ele fora de determinados parâmetros (esta última parte não interessa para nada, pois o meu imaginar em nada influencia a vida deste caralho). Soluções tenho poucas. Perante isto, e tenho consciência que estou a extrapolar muitas coisas de um episódio insignificante, um gajo ou ganha um sentido mais exacerbado da sua importância neste mundo e dedica-se activamente a procurar uma vida melhor para todos ou fecha-se num niilismo frouxito, assente na convicção de que tudo o que que nos rodeia neste momento não passa de um peido num vendaval. Pondo tudo isto em contexto, transversal ou temporal, somos apenas uma fracção de um grão de areia nas galáxias e planetas que por aí andam, ou uma fracção de segundo nos milhões de anos que nos precederam e que ainda sobram na história do universo. Só que mesmo um ateu como eu, que não atribui objectivos metafísicos à existência, nem adopta uma visão teleológica da evolução, não pode deixar de considerar a vida como uma coisa única e especial. É exactamente a aleatoridade da nossa existência, não só enquanto espécie mas também enquanto indivíduos, que me leva a não desistir de considerar a vida como algo de importante, que deve ser protegido e melhorado.

Só que isto leva a outros problemas. Como melhoramos a vida das pessoas? Atenção, vivo num país desenvolvido, com um sistema nacional de saúde, educação quase gratuita e outros serviços sociais. Ninguém está a morrer à fome neste contexto e só pessoas no extremo do mal-estar é que vivem na rua. Logo estou a a falar de uma melhoria que de certo modo entra no foro privado das pessoas. Trata-se de os ajudar a levar uma vida menos merdosa, ou menos violenta, ou menos auto-destrutiva, o que implicaria certamente interferir com as suas decisões individuais. Quem sou eu para o fazer? Todas as minhas decisões são boas? Foda-se! Certamente haverá quem ache que tendo em conta a minha posição inicial de partida na vida poderia ter conseguido muito mais. Se essas pessoas tentassem interferir com as minhas decisões dava-lhes um pontapé no filho-da-puta do rabo. Em termos estruturais, a educação apenas é solução no longo-prazo e sempre com falhas, os serviços sociais apenas ajudam nalguns casos e o terceiro sector não resolve nada. Salários em condições normalmente ajudam, mas no momento político em que vivemos ganhou o outro lado, aquele que gosta de pagar mal e esmifrar os trabalhadores.

Pouco me resta excepto a solidariedade silenciosa e um esforço individual para pelo menos dar uma vida boa aos que me rodeiam, o que está muito para lá da simples contribuição material e inclui o esforço de criar um clima conducível ao desenvolvimento pleno do nosso potencial. Quanto ao resto continuarei à procura do melhor veículo.

segunda-feira, 16 de março de 2015

Pós-modernismo

Tudo me leva a crer que o mundo em geral é um sítio bastante aprazível e que os seres humanos em particular são a melhor consequência aleatória da evolução, apenas secundados pelo momento em que a roda se deixou inventar por um bípede homo sapiens sapiens, sendo estes dois apenas terciados pelo momento em que se inventou, como produto da aprendizagem colectiva e do esforço individual, a sanita. Os seres humanos são especialmente mais interessantes e bondosos que os restantes animais que habitam o nosso prazenteiro planeta. Imagine-se que havia por exemplo 6 mil milhões (quase 7) de leões, ou cães, ou cabras montanhesas na terra, cruze-se essa especulação com a informação de que os animais irracionais raramente coexistem em grupos grandes, especialmente se houver mais que duas pichas ao barulho e chegue-se à conclusão que o bailado majéstico protagonizado diariamente por latagões pelo mundo fora nos seus vários movimento pendulares, especialmente em ambientes urbanos onde todos os dias nos cruzamos pelo menos com 10 pessoas parvas, sem que daí advenham erupções de pancadaria e desacatos violentos e antes pelo contrário as pessoas cheguem a ser simpáticas e prestáveis com estranhos, é sinal de que nós, seres humanos, somos uma coisa única, especial e bonita.

Tendo disto isto há dias de merda. Dias em que tudo o que nos foi dito, sugerido ou respondido parece ofensivo e só apetece um gajo desancar uma outra pessoa mais pequena que nós e que não consegue ripostar, ou fugir para o deserto e viver como aquele eremita cuja história partilhei antes, ou encharcar-se em vinho e cerveja até adormecer, torpe e confuso. Dias em que o Passos Coelho parece ainda mais um gigantíssimo monte de merda e em que os pronunciamentos do Cavaco, que prevê um crescimento económico acima do esperado pelo Governo (caralhos me fodam que este presidente é de tal forma espectacular que consegue encontrar tempo na sua agenda preenchida para rabiscar no guardanapo umas operações econométricas e oferecer as suas previsões de crescimento, actividade para a qual o Banco de Portugal contrata pelo menos 10 pessoas e o Governo outras 10, mais 10 para ajudar a carregar a pasta com os números do Parlamento para Bruxelas, que aquela merda é pesada), parecem ainda mais estapafúrdios e de má-fé. Não é que o gajo mal interferiu com as violações colectivas a que este governo tão prazenteiramente se entregou, mas agora já quer condicionar o próximo governo, sugerindo que tipo de reformas terão que ser implementadas.

Mas pronto meus amigos, o que é preciso é um gajo dormir de consciência tranquila, preferivelmente com os tomates vazios (ou a vagina devidamente esgotada) e o frigorífico carregado. Tudo o resto é supérfluo.

terça-feira, 10 de março de 2015

Uma anedota

Gostava de vos contar uma anedota. É assim: 

Santana Lopes

segunda-feira, 9 de março de 2015

Sou o maior do mundo

Alguém me explica porque é que não consigo engraçar com o João Magueijo? Tanta desenvoltura para depois escrever as merdas que escreve? Eu até gosto da ideia de um gajo ser professor de Física e ao mesmo tempo estar a cagar-se para as aparências. Só que isso só vale a pena se acrescentar valor ao discurso aborrecido e desinteressante que infelizmente domina o espaço publicado em Portugal. Mas este gajo só acrescenta merda. Naquele editorial do Público põe-se a falar da imprensa britânica e só diz cagadas. O gajo nunca leu o Guardian, o Independent ou o The Economist? Pois eu, na minha imensa sabedoria, raramente encontrei espaços de comunicação social onde a auto-crítica fosse tão normal. O Magueijo deve ter dado uma olhadela aos pasquins de direita, onde naturalmente o patriotismo paternalista deverá dominar, assim como domina em Portugal, na Alemanha ou nos EUA, e extraiu daí conclusões que lhe permitem permanecer confortavelmente ignorante sem ter que se sentir culpado. Se calhar se o gajo aplicasse a estas observações a mesma atitude de observação sistemática que eu assumo ele aplique ao estudo da física, conseguisse chegar a conclusões mais interessantes. Já quando ele publicou aquele livro fiquei mal impressionado, pela mesma razão. O tipo sugeriu que as britânicas mais facilmente oferecem broches que dois beijinhos na cara. A sério? Há aqui não só um conservadorismo mal-cheiroso (e se fosse verdade, qual é o problema?) como uma falta de vontade brutal em observar verdadeiramente uma realidade que lhe é estranha para depois oferecer um comentário interessante e novo. Poderia ter mantido o mau-gosto, que bem feito e no lugar certo tem a sua piada, a atítude crítica, a vontade de dizer mal e tudo o resto, mas ter usado essas coisas para dizer alguma coisa interessante. Assim parece apenas um velho resmungão, que se está a cagar para as aparências e se mija pelas pernas abaixo porque acha que o mundo lhe deve algo, em vez de um gajo sem preconceitos que usa a sua posição privilegiada para comunicar algo de novo.