terça-feira, 6 de janeiro de 2015

Os portugueses que dizem mal dos Portugueses deviam ir todos à merda

Falo-vos secamente e sem segundas intenções: os portugueses que dizem mal dos ‘portugueses’ são na sua maioria ignorantes, paroquiais e estúpidos. Façamos aqui um exercício de reflexão que me ajuda a clarificar tal afirmação.

Imaginemos uma aldeia pequena e isolada. Um dia um dos habitantes tem que se meter no autocarro e ir à cidade por duas semanas, por razões várias. Fica em casa do tio-avô, jardineiro na junta-de-freguesia de Benfica e após resolver os seus afazeres vai dar uma volta pela capital. Acha a baixa muito bonita, ofende-se com as liberdades a que se permitem os homosseuxuais quando protegidos pelo cosmopolitanismo do Bairro Alto e senta-se num banco no Parque das Nações a admirar a Ponte Vasco da Gama. Quando volta à aldeia sente-se um homem mudado e as rotinas que antes o confortavam parecem-lhe agora opressivas. A sua revolta interior vira-se para fora e passa a olhar para os restantes aldeãos com desprezo, criticando as suas vistas curtas e falta de ambição. Nem os pesadelos ocasionais, em que se imagina numa orgia homossexual com um homem efeminado a afagar-lhe o escroto enquando um bear peludo o penetra violentamente, o demovem da sua obsessão com a óbvia superioridade da vida urbana.

Ora pergunto eu: quem é neste contexto o verdadeiro pacóvio? O ignorante, cuja falta de ambição intelectual deriva das limitações óbvias do ambiente no qual nasceu, e que como nos ensinou o pai Marx, não é produto da sua acção? Ou aquele que após ter adquirido um conhecimento superficial e pouco sistemático da vida para além da aldeia se acha mais evoluído, embora daí não resulte nenhum desejo de aprender verdadeiramente e profundamente, mas apenas a vontade de adquirir meia dúzia de dados que lhe permitirão confirmar e enraizar o seu preconceito e arrogância? A resposta está obviamente implítica na forma como fiz a pergunta.

O agente ignorante, pacóvio e provincial é aquele que se contenta com saber o suficiente para se elevar um bocadinho acima da merda e não aquele que ignorando essa possibilidade tão pouco a pode equacionar.

Vem isto a respeito do livro publicado por esta gaja. A premissa é desde logo estúpida: diz que fez entrevistas e procurou informação para desenvolver a sua tese mas depois diz também que isto são as coisas que sempre disse. Logo coloca-se nesta categoria dos que não querem verdadeiramente aprender nada mas apenas confirmar a sua arrogância completamente despropositada. Porque meus amigos, se Portugal não é o melhor país do mundo, tão pouco é o pior. Portugal é o que é, um país pobre até há pouco tempo, que melhorou nalgumas coisas muito rapidamente, noutras devagar e noutras pouco ou nada.  Se esta senhora fosse menos paroquial e ignorante e fosse mais bem intencionada teria concluído isto mesmo e teria evitado estragar meia dúzia de árvores a publicar um conjunto de páginas fixadas numa lombada a que alguns ousaram, corajosamente, chamar uma reflexão.

Mas isto não acaba aqui. Esta arrogância é comum em certos e determinados quadrados da sociedade portuguesa. Já o cagalhão do Salazar se apoquentava com a pieguice e excesso de emoção dos portugueses. Pior, parece-me que este desprezo é comum entre aqueles que tragicamente nos governam. A bem da verdade o desprezo é mútuo sendo que no entanto o nosso desprezo por esses selvagens é justificado.

O que é que significa tudo isto? O que eu gostava mesmo, mesmo, mesmo era que todo e qualquer debate fosse influenciado por pelo menos uma vontade de saber, aliada a uma genuína humildade intelectual. Sendo que isso não vai acontecer sugiro em alternativa que da próxima que se depararem com um destes animais, que fale com regozijo do ‘óbvio’ desajustamento cultural dos portugueses às necessidades da vida moderna, reajam dando-lhe um par de estalos pós-modernos, daqueles que demonstram a futilidade de qualquer argumentação adicional, deixando ainda assim bastante claro o vosso posicionamento.