segunda-feira, 26 de janeiro de 2015

Viva o Syriza de ontem; abaixo o Syriza de amanhã!

O mundo (ou a vida, dependendo das vossas sensibilidades estéticas), na sua desavergonhada tendência para mudar pouco, raramente muda muito. Desse ponto de vista a vitória do Syriza não trará nem o fim do mundo nem o princípio do fim para quem tem mandado no mundo. Dito isto, saúdo, aplaudo e regozijo-me com a vitória destes jovens, a quem desejo as melhores felicidades.

Já chega de austeridade caralho! Ainda não perceberam? Acho piada aos austeros, que perante o falhanço espetacular da sua pequenina experiência com a vida de todos nós, carregam para a frente, dizendo que o problema foi que não houve austeridade suficiente. Isto faz-me lembrar os anos 90, quando se tornou irremediavelmente claro para todos que a União Soviética tinha sido apenas um projeto de assassinato em massa, que a China já não era o que nunca tinha sido e que em Cuba só se aproveitavam os resorts, e os comunas que ainda restavam diziam: o problema é que até agora não houve comunismo a sério, mas da próxima vai correr tudo bem, confiem em nós. Em vez de reconhecerem as falhas estruturais do seu projecto, focavam-se nos supostos desvios, ignorando que os desvios eram na verdade centrais a qualquer sociedade ditatorial e centralizada.

Não querendo comparar a Merkel e o Passos Coelho ao Estaline e ao Mao-Zedong, porque jamais me passaria pela cabeça insultar dessa forma estes últimos (não pude resistir à tentação de fazer esta piadola, desculpem), a defesa da austeridade sob o argumento de que o único problema foi a sua insuficiência cai na mesma falácia argumentativa. Claro que houve austeridade minhas bestas e não levou ao que vocês previam, a saber: ao retorno do crescimento económico, desta vez assente num sector privado dinâmico e competitivo e à resolução do problema da dívida pública. É hora de assumir o erro e calarem-se. Em vez disso vemos os austeros passar da agressividade de 2010, quando batiam no peito assombrados com a sua própria espetacularidade, para o ressabiamento piedoso de 2014, quando dizem: ai é, não gostam de nós, podia ter sido pior, como se atrevem a criticar-nos, acham que o Costa e o Tspiras são melhores, logo verão, quando já não poderem contar com pessoas de bem como nós - isto antes de irem trabalhar por convite para uma consultoria qualquer a 'abrir portas', como os grandes empreendedores que são.

A eleição do Syriza não vai permitir correr imediatamente com esta corja, até porque a única mudança que corre bem é aquela que ocorre gradualmente e na continuidade. Tendo em conta a promessa que representa este partido, é inevitável que em breve eles desiludam uma parte importante da sua base de apoio (porque vão ter que andar devagar), ou então que façam disparate, andem demasiado depressa e se tornem nos venezuelanos da europa. Seja como for, vão desiludir tanto os críticos como os apoiantes. Mas se conseguirem mover um milímetro que seja a política europeia no caminho da reconstrução da social democracia, do reequilíbrio das forças políticas e do enrabamento colectivo da 'indústria' financeira, terão os meus parabéns.

PS. O Bruno Alves, entre cacetadas, decidiu escrever sobre a Grécia e o Syriza. Fico surpreendido que tenha escrito tanto e coisas tão interessantes, ainda por cima n'O Insurgente. Cruzes credo! Não posso dizer que concorde com tudo, mas isso também se aplica ao que eu escrevo aqui.