sexta-feira, 7 de novembro de 2014

Fantasmas

Quem nos dera ser assombrados pelos economistas mortos do Keynes. Pelo menos haveria alguma sofisticação na forma como se pensam as merdas. É que no nosso caso esvoaçam sobre a economia portuguesa os fantasmas do aspirante a padreco Oliveira Salazar e um fantasma híbrido do Vasco Gonçalves e do François Mitterrand. A direita picha murcha que temos gosta pouco da economia de mercado. Tal como o aspirante a padreco, fala muito dela e inclusive prega a necessidade de garantir a sua autonomia. Mas na prática, quando há que tomar decisões, preocupa-se acima de tudo com a manutenção da oligarquia dominante, não vá a concorrência causar alguma mudança na sociedade portuguesa, o que seria muito aborrecido.

A esquerda picha curta que temos oscila entre uma versão mais social do Estado Novo e uma versão pós-moderna do PREC, com uns pós de primeiros dois anos de governo do Mitterrand (lembro aos filisteus que Mitterrand nacionalizou uma série de coisas em França quando chegou ao poder, mas dois anos depois começou a vender tudo, quando percebeu que a gestão destas empresas pelo sector público estava a facilitar demasiado a sua ambição de dormir com as filhas dos CEOs, o que não lhe agradava, porque nada o excitava tanto como um não que claramente queria dizer sim, ah sim, ele sabia bem o queriam todas essas malandras). Ou seja, a esquerda continua a comer às colheradas cheias esta conversa de merda de manter os centros de decisão em mãos portuguesas, para depois os usar para estimular a inovação, o conhecimento e os empregos do Jorge Coelho. Só que esta conversa, para além de ser contraproducente, porque qualquer animal selvagem percebe que uma empresa protegida nunca será tão inovadora quanto uma que tem que competir, é também producente de um clima de promiscuidade entre meia dúzia de organizações que obviamente põe em causa a implementação de qualquer política séria de esquerda. Mas é preciso ser eu a explicar esta merda que devia ser evidente caralho?

Estes fantasmas têm vindo ao de cima nos últimos anos quando se discutiam as privatizações e agora ainda mais, com histerismo sobrelevado, com a merda da PT. Ora foda-se, a única razão pela qual a PT está quase na falência é exatamente devido à política de proteção dos tais centros de decisão (já agora, para os incautos, reparai que decisão rima com cagalhão), que encorajou a acumulação de tanto poder no BES e noutros sítios mal frequentados. O que é preciso é partir tudo aos bocados, vender e seguir em frente. Mas vender mesmo. Não é vender aos Angolanos, nem aos Chineses, nem ao Paulo de Azevedo (Paulo é um nome bastante menos distintivo que Belmiro, o que prejudica um escritor como eu, que claramente privilegia a brevidade e que como tal preferia poder usar apenas o primeiro nome, o que é impossível com Paulo, devido à falta de distintividade). Acham mesmo que vamos deixar de ter telefones fixos, ou serviço de telemóvel se vendermos isto tudo?

É preciso correr com esta corja, desde os fantasmas medíocres que nos assombram, às pessoas de bem que nos foderam sem misericórdia e reconstruir o que existe com outra base. Existe por aí gente para o fazer, só é preciso uns murros (figurativos claro, que isso de violências parece mal) aqui e ali e chegamos lá.