domingo, 30 de novembro de 2014

Resposta ao anónimo de há duas postas atrás

A situação que vivemos nestes últimos anos neste nosso belo país elícita a qualquer pessoa não-psicopata um conjunto limitado de sensações fortes. Para alguns será a frustração, para outros a resignação, para outros a fúria, mas muito pouco para além disso. Tirando meia dúzia de filhos-da-puta enviados por belzebu para nos aterrorizar a merda da vida, fixados na sua própria espetacularidade e abnegação no momento de impor aos portugueses sacrifícios, que como o saberá Nossa Senhora muito lhes custa na sua infinita piedade, pouca gente falará hoje dos últimos anos como um período em que se fizeram as reformas necessárias. Mais, mas isto ficará para uma próxima oportunidade, as reformas verdadeiramente necessárias, algumas delas admito mais próximas do pensamento de direita, não se fizeram; as coisas positivas que aconteceram (como a implosão do BES), deveram-se a inevitabilidades; tudo o resto foi mau, feito com rancor e voluntarismo (não sei o que significa voluntarismo, mas parece-me apropriado neste contexto). Eu não acredito que o Passos Coelho quisesse há 5 anos atrás implementar estas políticas; mas quando chegou ao poder e lhe foi dada apenas essa opção, prosseguiu-a com a violência própria de quem passou uma vida inteira à espera deste momento, e que como tal jamais arriscaria a sua posição desafiando pessoas exteriores ao governo que exigiam isto mesmo e que são muito mais poderosas e estão mais bem preparadas do que ele.

O que nos leva ao Sócrates. O Governo do Sócrates caracterizou-se, em retrospetiva, por muito movimento e pouca acção: algumas mudanças marginais, ainda que simpáticas, no funcionamento do setor público (qualquer pessoa que se recuse a admitir que é bastante mais fácil tratar da papelada hoje em dia do que era há 15 anos atrás, poderá e deverá ir, respeitosamente, à merda), algumas tentativas de criar novos campeões nacionais usando o poder financeiro do estado (ver os casos da Critical Software e da YDreams, que desapareceram dos jornais quando secou a teta pública) e uma coligação com a oligarquia dominante através de um abuso estapafúrdio das parcerias público-privada, que supostamente teria levado ao crescimento. Reformas a sério houve poucas e de pouca consequência.

Deteta o caro anónimo o subtexto que estrutura estes parágrafos? A maior parte das merdas a que fomos sujeitos nos últimos anos (incluindo nos governos do Sócrates) foram, apesar da brutalidade, legais. Sim, eu também quero mandar esta corja toda para a puta da prisão e substituí-los sabe-se lá com quem (sim, sim, eu sei, não são todos iguais...), mas até prova em contrário o único mecanismo que temos para nos livrar deles são as eleições. Tudo o resto, desde a licenciatura do Relvas, aos negócios da Tecnoforma, aos investimentos do Cavaco no BPN, mesmo que tenham acontecido no limite da legalidade, terão ainda assim, muito provavelmente, ocorrido dentro da legalidade. Poder-se-á dizer que o problema é que as leis aceitam merdas que deviam ser ilegais, mas aí, caros amigos, continuamos no domínio da política e não da justiça. Foi por isso que escrevi o que escrevi, surpreendido que o Sócrates se metesse numa coisa destas, quando poderia ter ganho muito dinheiro de forma legal. As cabalas não existem meus amigos, não porque as pessoas sejam particularmente simpáticas, mas porque as cabalas são perigosas. O PSD não estará indefinidamente no poder, logo teria pouco interesse em iniciar um processo que dentro de pouco tempo se poderia virar contra si.

Quanto ao específico do que diz o anónimo, sobre quem é mais corrupto, ao fato de esta história ainda estar no início e ao significado de ser o CM a transmitir a história, não tenho informação para dizer que esteja correto ou errado. Com todo o respeito que qualquer comentador deste blogue me merece, tenho pouco interesse em conjeturar sobre o que significa aquilo que não se vê, porque há matéria suficiente naquilo que se vê para alimentar montanhas de fúria.

PS. Peço desculpa por ter demorado tanto tempo a responder, estava ocupado em mais uma das minhas voltinhas profissionais.