sexta-feira, 7 de novembro de 2014

Temos os que merecemos?

Dizem os parvos armados em espertos que cada país tem os políticos que merece. Mas perdoai-lhes senhor, pois a sua parvoíce impede-os de saber o que dizem.

É óbvio que nenhuma população escolhe os políticos que quer. Através da agregação de vontades individuais que é o voto, as pessoas escolhem quem podem, ou seja quem se apresenta a eleições, sendo que para chegar a esse ponto é preciso passar por uma máquina de triturar vontades cuja lógica tem muito pouco a ver com quem é o melhor para governar. Essa máquina são os partidos, com todas as suas redes de cumplicidade e conflito, e a sua lógica interna é aquela que estrutura qualquer organização: o desejo de sobreviver no mínimo e de crescer no ideal, com o mínimo de instabilidade possível. As pessoas dos partidos, dentro de cujas cabeças se materializa uma determinada cultura que constrange o que vem a seguir, promovem quem lhes garante essa estabilidade e porventura quem lhes permitirá crescer, através da distribuição de cargos melhor remunerados do que os que têm no momento. Isto é normal e passa-se em todo o lado. O importante é que hajam mecanismos de correção, que permitam que quando o interesse egoísta dos que estão dentro fica fora de controlo, haja um processo de renovação. Nas empresas, exceto aquelas protegidas pelo plano tecnológico (lembram-se? Que bonitos foram esses anos, quando nos íamos tornar num país exportador de tecnologia, sustentado por salários médios de pelo menos 10.000 euros), esta coisa acontece através da restruturação, ou no limite, da falência. No sector público acontece, ainda que de forma limitada com as eleições. Mas tem que acontecer acima de tudo com a movimentação sistemática de forças externas aos partidos, que os obrigam ocasionalmente a ter que ouvir um grupo diferente de pessoas e a construir novas coligações de poder, que mudam o quadro de referência dos aparelhos partidários e (com sorte) permite-lhes conceber a ideia de que têm algo a ganhar com o serviço do interesse público. Em Portugal isto não aconteceu, porque só se ouvia até recentemente meia dúzia de pessoas, que nunca mudavam, o que incentivava os partidos a promover quem conhecia bem os ditos cujos. Claro que as merdas estão a mudar, só que em vez de uma restruturação de baixo, que levaria a uma mudança da cultura e lógica internas dos partidos, estamos a assistir a uma restruturação de cima, em que as redes estão a ser reconfiguradas com figuras ainda piores do que antes (vede os filhos de Angola), para que tudo mude podendo ficar ainda pior. Os portugueses não têm os políticos que merecem; têm os políticos que lhes é permitido ter; e são uma merda.